Hoje em dia estamos bastante acostumados a festejar o GP australiano. Afinal de contas, há alguns anos a prova na terra dos animais estranhos e insetos gigantes costuma ser um oásis onde matamos nossa sede de Fórmula 1, após um longo e tenebroso inverno (ou, no caso dos cabeças de gasolina brazucas, verão). Mas houve um tempo em que partíamos em nossa jornada anual pelas terras da decoração natalina e blocos carnavalescos após nos despedirmos do circo justamente lá no continente dos cangurus.
Em 1995 isto aconteceu pela última vez, num dia 12 de novembro. A prova, realizada no circuito de rua de Adelaide, foi a décima-sétima e derradeira daquele campeonato e, fazendo jus à necessidade de ser o Crocodilo Dundee para sobreviver por ali apenas 8 dos 23 pilotos que aceleraram no início da prova viram a bandeira quadriculada.

Os campeonatos já estavam decididos, com Schumacher garantindo o bicampeonato no GP do Pacífico e a Benetton colhendo seu solitário título de construtores no GP do Japão. Nos treinos livres de sexta, um susto: Mika Häkkinen teve um pneu estourado e voou, batendo com força no anteparo. Seu capacete chocou-se contra o volante, causando uma pequena fratura em seu crânio e a consequente perda de consciência do piloto. O socorro médico (que, por sorte – um eufemismo que significa planejamento – estava justamente naquela curva no momento) realizou o atendimento imediato, sendo necessária uma traqueostomia de emergência para desobstruir as vias aéreas do finlandês, que foi levado para o hospital e recuperou-se rapidamente, contudo não a tempo de participar da corrida.
Enquanto isso, as Williams dominaram o classificatório, com dobradinha Hill-Coulthard na primeira fila. Logo atrás largavam um despreocupado Schumacher e a Ferrari de Berger. Atrás de Schumi, e já sabendo que iria trocar de máquina com o alemão no ano seguinte estava Alesi e, ao lado dele, Frentzen, com a Sauber-Ford.
Coulthard trocou de posição com o companheiro de equipe na largada, assumindo a liderança. Schumacher já estava pensando em Maranello, e quando olhou para o lado Berger e Alesi já tinham passado, porém o alemão rapidamente recuperou o terceiro posto.
Quando começou a primeira rodade de pitstops os pilotos começaram a cair como moscas: Coulthard liderava a corrida e também o fez na debandada, indo com muita sede ao pote ao entrar nos pits, não conseguindo frear e acertando o carro no pitwall. Uma façanha digna da música dos Trapalhões. Logo depois Schumacher a Alesi se encontraram na pista e, como um estava de olho no carro do outro, acabaram batendo. Johnny Herbert assumiu a segunda colocação atrás de Hill, entrou nos pits do mesmo jeito que Coulthard e, apesar de conseguir evitar o muro, perdeu o ponto de parada nos boxes da Benetton, fazendo um drive through ridículo. Berger herdou a vice liderança até seu motor ir para os ares. Em seguida veio Frentzen, e no caso dele foi o câmbio que não gostou da segunda posição e desistiu da prova. Herbert, que a essa hora já tinha parado de novo e desta vez com sucesso, voltou a aparecer atrás do líder, mas seu carro também teve problemas mecânicos e ficou pelo caminho.

Neste momento, a poucas voltas do fim da corrida, tínhamos Damon Hill reinando sozinho na primeira colocação, uma volta à frente da Ligier de Panis e duas a mais que o surpreendente Gianni Morbidelli com a Footwork-Hart. Ainda houve tempo para Hill dar outra volta sobre Panis, mas as três colocações finais ficaram assim mesmo.
“Puxa, Valesi, a corrida parece ter sido legal, mas por que no texto você disse que foi cheia de efemérides?”, está se perguntando o cabeça de gasolina neste momento. Vai lá a explicação então, em forma de lista para não ficar muito extenso:
- Foi o último GP da Austrália fechando o campeonato – desde então a prova é disputada no início do ano;
- Foi também a última corrida em Adelaide, já que a partir de 1996 o GP australiano passou a ser disputado em Melbourne;
- Berger se tornou o único piloto a participar de todas as provas ocorridas em Adelaide até hoje, um total de 11 vezes presente – das quais venceu duas, uma pela Ferrari (87) e outra pela McLaren (92).
- Foi o único pódio da carreira de Morbidelli;
O que tinha de lenta tinha de bonita, essa tal Footwork. FONTE: Reddit - Foi também o único pódio de sua equipe, a Footwork (um dia precisamos falar sobre ela, que era Arrows até 1990 e tornou-se Arrows novamente em 1997);
- A sétima posição de Pedro Paulo Diniz marcou a melhor chegada da equipe Forti, que durou apenas dois anos na categoria;
- Despediram-se da F1 Karl Wendlinger e Roberto Pupo Moreno, além do outro piloto da Footwork, o fenomenal e impagável japonês Taki Inoue. Vale a pena fazer uma conta no Twitter só para seguir as barbaridades hilárias que ele posta em @takiinoue.
- Este GP aconteceu exatamente 22 anos antes do Grande Prêmio do Brasil de 2017 e, quando este texto for publicado, o escriba estará em Interlagos, e espera sinceramente que alguém o aborde e diga que lê estas besteiras escritas aqui no Boletim do Paddock.
FORA DAS PISTAS
Nasceram em 12 de novembro o infame Charles Manson (1934), o excelente Neil Young (1945), o premiado e inexpressivo Ryan Gosling (1980) e a bonequinha de luxo de nossa geração Anne Hathaway (1982).
E, em 1965, em um ginásio escolar de New Jersey, uma banda que influenciaria boa parte do rock nos anos 70 e 80 fez seu primeiro show ao vivo. O Velvet Underground recebeu 75 dólares pelo espetáculo. Fiquemos com a simplicidade apaixonante Sweet Jane.