Apesar de ser o segundo mais longo do calendário, o circuito de rua de Jeddah é um dos mais rápidos do calendário. A pista, que recebeu a F1 pela primeira vez em 2021, não foi a primeira opção para receber a categoria.
A Arábia Saudita tem uma longa tradição em apoiar o automobilismo. Desde os anos 1970, a Saudi, companhia aérea do país, patrocinou a equipe Williams e nos últimos anos, a Aramco se tornou a principal patrocinadora da F1, com a empresa também fechando um acordo com a equipe Aston Martin em 2022.
As competições também começaram a ter destaque no país, que logo lançou um programa de jovens talentos no kart, empolgados pela chegada da Fórmula E em 2018, que realizou suas corridas em um circuito de rua em Diriyah e da Extreme E, que realizou a etapa de estreia da categoria no país em 2021.
O aumento das competições esportivas faz parte do plano Saudi Vision 2030, lançado pelo príncipe herdeiro Mohammed Bin Salman, que visa tornar o país menos dependente do petróleo, promovendo o desenvolvimento econômico e investindo no turismo e nas atrações esportivas. Por conta disso, não demorou muito para que a ideia de sediar uma etapa da F1 saísse do papel, com o país assinando um contrato de 15 anos com a categoria.
A princípio a corrida seria realizada em um novo circuito, que seria construído na cidade de Qiddiya. A pista foi projetada pela Test and Training International, empresa encabeçada pelo ex-piloto Alexander Wurz e o projeto previa a construção de um circuito que pudesse receber qualquer categoria ligada à FIA, inclusive a F1.
Apesar do projeto continuar em pé, a F1 acabou optando por outro local para a corrida inicial, já que não queria fazer a corrida em um circuito ainda em construção. A Saudi Automobile and Motorcycle Federation conseguiu uma parceria que traria a F1 para as ruas de Jeddah, cerca de 950 km da capital Riyadh. Espera-se que Jeddah receba as corridas nos primeiros anos de contrato, com o circuito em Qiddiya substituindo a pista em Corniche nos demais anos, assim que as obras ficarem prontas.
Com a corrida inaugural sendo anunciada para o final de 2021, faltava apenas o local. Uma comissão da F1 começou a procurar um lugar que fosse o ideal para receber a categoria. Depois de muitas simulações, a comissão chegou no país para ver de perto os locais que estavam na disputa. O favorito era uma área na região de Corniche, cerca de 12 km do centro de Jeddah e ao lado do Mar Vermelho.
Mesmo tendo feito as simulações em computador, a F1 chamou novamente a empresa de Hermann Tilke, famoso projetista de circuitos, que dessa vez colocou seu filho Carsten para chefiar o projeto final na pequena faixa que foi destinada para a construção da pista. O projeto também visava evitar algo comum em pistas de rua, como curvas fechadas e de baixa velocidade. Para Jeddah, o traçado de 6,174 km conta com 27 curvas, a maioria mais fluída, e uma delas ainda conta com um pequeno banking.
O maior desafio foi o tempo. A equipe de Tilke teve menos de um ano para concluir a nova pista e diferente do que acontece nos demais circuitos desse tipo, boa parte das ruas tiveram que ser construídas no local, assim como todo o sistema de drenagem, o que fez com que a equipe tivesse que elevar toda a extensão da pista em um metro e meio. Isso sem contar nos demais prédios para abrigar as equipes e a estrutura básica necessária, que também precisaram ser construídas do zero. As obras começaram em abril de 2021 e com a corrida agendada para dezembro, começaram a surgir fotos do circuito ainda em construção, com as obras visivelmente atrasadas.
O tempo foi passando e o circuito ainda parecia longe de estar pronto para a corrida. Um mutirão de 1.250 trabalhadores passou a trabalhar dia e noite para instalar os 3.300 blocos de concreto, 3.000 blocos de barreira TecPro e 37 toneladas de asfalto, garantindo que o circuito ficasse pronto até o dia 3 de dezembro, dia em que estava marcado para acontecer os primeiros treinos livres.
VEJA O VÍDEO PARA CONHECER MAIS: JEDDAH!
Um guia sobre: o GP da Arábia Saudita
A pista ficou pronta a tempo para ver a disputa acirrada entre Lewis Hamilton e Max Verstappen, que estavam brigando pelo título daquele ano. Por conta de seu traçado estreito, a corrida foi interrompida duas vezes por bandeiras vermelhas, para a retirada dos carros e limpeza da pista. No final, Hamilton saiu com a vitória depois de marcar a pole no dia anterior, com Verstappen e Valtteri Bottas completando o pódio.
O estreito traçado fez com que algumas das curvas do circuito tivessem pontos cegos, que aliado às altas velocidades, preocupou os pilotos durante a primeira corrida. Para a corrida de 2022, os organizadores promoveram mudanças nas curvas 2, 3, 14 e 21, que tiveram suas barreiras recuadas entre 1,5 e 2 metros, com os limites de pista continuando os mesmos, mas com os pilotos tendo mais visibilidade e área de escape. Já na curva 27, a última do traçado, a saída foi alargada em 1,5m. E as barreiras das curvas 4,16, 22 e 24 também sofreram modificações a pedido dos pilotos, que solicitaram um material mais macio, para que eles possam bater de leve sem danificar o carro.
Se a pista rápida e fluída pode agradar aos pilotos, a escolha da Arábia Saudita como local para uma etapa da F1 continua gerando controvérsia entre os fãs, já que o país é conhecido por suas violações aos direitos humanos. Com 97% da população sendo de muçulmanos sunitas, tido como ultraconservadores, prisão e até pena de morte são penas aplicadas no caso de homossexualidade. Para protestar contra a discriminação, Lewis Hamilton correu novamente com o capacete usado no Qatar, com a imagem de um arco-íris, símbolo da comunidade LGBTQIA+.
LEIA MAIS: Em estreia do GP do Catar, Hamilton defende a diversidade e estampa arco-íris em capacete
As mulheres também sofrem no país, já que não há leis contra a violência doméstica e até 2019, as mulheres eram obrigadas a ter um guardião e obter dele autorização para viajar, estudar ou trabalhar. Por conta do Saudi Vision 2030, as mulheres sauditas conseguiram algumas conquistas, como o direito ao voto e o fim da segregação de gênero em ambientes de trabalho, o que antes dificultava a contratação de mulheres, e o direito a abrirem seus próprios negócios. Além disso, as mulheres acima de 21 anos já podem solicitar seu passaporte e viajar sem autorização de seus guardiões. Em 2018, elas também conquistaram o direito de dirigir, ainda que as ativistas que lutaram por esse direito tenham sido presas por brigar pela mudança. Para marcar a ocasião, a pilota Aseel Al-Hamad andou com um carro da F1 antes do GP da França.
LEIA MAIS: Renault celebra permissão para mulheres dirigirem na Arábia Saudita em Paul Ricard
Saudi Arabian Aseel Al-Hamad, the first female member of the Saudi Arabian Motorsport Federation, to drive the @PaulRicardTrack, in the 2012 @RenaultSportF1 car today ahead of the #FrenchGP.
👉 https://t.co/tzyEzSfs7I#RSspirit #RACEday #SheDrives pic.twitter.com/N6WhhUpAWs— Alpine F1 Team (@AlpineF1Team) June 24, 2018
Ainda em 2018, a pilota saudita Reem Al-Aboud, de 19 anos, teve a oportunidade de pilotar um carro da Fórmula E, nos treinos que aconteceram no dia seguinte após a etapa da categoria no país.
Al-Aboud já tinha feito história no mês anterior, sendo a primeira mulher a participar de uma corrida junto a homens na Arábia Saudita. Outras pilotas, incluindo a emiradense Amna Al Qubaisi, Pippa Mann, Tatiana Calderon, Carrie Schreiner, Carmen Jordá, Beitske Visser, Jamie Chadwick, Simona de Silvestro e Katherine Legge, também participaram dos testes com a categoria.
Em novembro de 2019, a pilota da F4 britânica Reema Juffali, participou como convidada da corrida Jaguar I-Pace eThophy, que antecedeu a etapa da Formula E em Diriyah. Foi a primeira vez que uma mulher participou de uma competição internacional na Arábia Saudita.
LEIA MAIS: 1ª pilota da Arábia Saudita, Reema Juffali é nomeada embaixadora para o GP de Fórmula 1
Durante o fim de semana, o projeto Girls on Track também fez atividades na cidade, estimulando meninas a se interessarem pelo kart ou por carreiras no automobilismo.
Conheça a Série Circuitos da F1 e outras histórias!