Uma das variáveis mais importantes no automobilismo é o tipo de pneus utilizado. Desde o tempo em que cada time na Fórmula 1 era livre para escolher seu fornecedor (o que fez com que equipes médias tivessem sucessos históricos, ou que acontecessem aberrações como EUA 2005) até os dias de hoje, quando a italiana Pirelli fornece todos os compostos mas os diferencia por durabilidade e aderência, deixando os fãs alucinados fazendo contas de possíveis estratégias e de quebra irritando daltônicos mundo afora, o calçado do carro pode ser o fator mais importante para a agonia ou o êxtase em determinada prova.
No dia 20 de dezembro de 1868 nasceu o homem que apresentou a borracha ao asfalto e começou esta revolução. Até então, as carruagens utilizavam pneus de madeira para o transporte de cargas ou pessoas. Harvey Samuel Firestone mudou isso definitivamente.
Filho do meio de Benjamin e Catherine Firestone, Harvey nasceu e criou-se na típica zona rural norte-americana do fim do século XIX, em Columbiana, Ohio. Seu pai trabalhava na fazenda que havia sido do pai dele. A família estava nos Estados Unidos há mais de 100 anos – Hans Nicholas Feuerstein imigrou da França em 1753, e os filho de Hans traduziram o sobrenome alemão, que significa “pedra de fogo” pra o inglês. Ao final da adolescência foi para a “cidade grande” completar os estudos, casar e arrumar um emprego, e a velha história do american dream começou.
Visionário, durante seu período como empregado da Columbus Buggy Works, empresa fabricante de carruagens, juntou 20 mil dólares e largou o emprego para fundar no ano de 1.900 a Firestone Tire & Ruber Company, sediada em Akron, na sua Ohio natal. Ele tinha certeza de que o futuro era a borracha, e os pneus sólidos fabricados com esse material produzidos por Firestone rapidamente tomaram o gosto dos donos de carruagem, pela maior durabilidade e conforto envolvidos, além do ganho em velocidade. O grande golpe de sorte foi conhecer outro jovem talento americano e persuadi-lo a adotar sua ideia; Harvey tornou-se amigo de Henry, e este acabou convencido a fazer uma encomenda de 2.000 pares de pneus de borracha para equipar os veículos que estavam sendo produzidas em sua fábrica, a Ford.
Calçando os Modelo T a Firestone atingiu a fama, e ao equipar o carro vencedor de Ray Harroun na primeira edição das 500 milhas de Indianápolis em 1911 a marca conquistou uma aura de esportividade. Com o número de automóveis nos Estados Unidos saltando de 8 mil para 2,5 milhões em 15 anos, Firestone tornou-se rico e influente. O lobby que fazia no Congresso para a abertura de estradas e apoiando o transporte rodoviário (Ship by truck!, ou Envie por caminhão! foi uma campanha de sucesso patrocinada por Harvey exigindo das autoridades a criação de uma malha viária melhor e mais eficiente) garantia o futuro de sua atividade. Firestone, Ford e outro amigo, um tal de Thomas Edison, formavam no início do século XX o que ficou conhecido como o “Clube dos Milionários”, que encabeçava os avanços na indústria ianque.
Durante a Grande Depressão Harvey reinventou-se novamente e criou os pneus de baixa pressão para tratores, mirando os pequenos proprietários rurais, um pouco menos afetados pelo crash da bolsa. Ao falecer em sua mansão em Miami Beach em 07 de fevereiro de 1938 aos 69 anos, além de milionário Harvey Firestone deixava um legado de pioneirismo e avanço tecnológico que não pereceu com seu criador.
Como exemplo, durante a Segunda Guerra, a Firestone produziu não só pneus mas também esteiras para tanques e asas para aviões. No início dos anos 50 a empresa tornou-se a maior produtora de borracha do mundo, e estava lá em Indianápolis, na terceira prova da F1, equipando o carro do vencedor Walt Faulkner. Na Europa, Graham Hill foi o primeiro piloto a vencer uma prova de Fórmula 1 sobre pneus Firestone, que também estavam presentes nos triunfos inaugurais de Jim Clark. Foram ao todo 49 vitórias em 121 Grandes Prêmios. Quatro títulos de piloto e três de construtores foram conquistados por carros que usavam pneus Firestone.
Esta é uma era de velocidade. O homem moderno exige cada vez mais velocidade. Os gênios do mundo automobilístico competem uns com os outros para produzir maravilhosos mecanismos que viajam mais rápido, com uma segurança compatível
A Firestone sabia que a visibilidade nos esportes era muito importante para a marca, e equipava times na F1, NASCAR, CART, campeonatos de dragsters e de monster trucks. O lema era “vencer no domingo para vender na segunda”, e estava dando certo.
Em 1971 a Lotus e a March apareceram com uma novidade no grid da Espanha: os pneus slick. Com a banda de rolagem sem renhuras, os pneus lisos permitem a maior área de contato possível com o asfalto e maximizam a tração; a velocidade subia de maneira diretamente proporcional.
Tudo ia bem até a crise do petróleo nos anos 70. Com o embargo imposto pelos países produtores em 73, não só a Firestone como outros fabricantes de pneu no Ocidente começaram a perder mercado, não só pela matéria prima mas também porque a população evitava longas viagens devido ao alto preço do combustível. A queda foi tão intensa que em 1975 a Firestone anunciou sua retirada das competições esportivas e, em 1988, acabou sendo adquirida por outra gigante do setor, a japonesa Bridgestone. A marca nipônica manteve a denominação original nos Estados Unidos, e a Firestone voltou às competições na década de 90, e ainda percorre a toda velocidade o asfalto de ruas e circuitos, tanto na CART quanto na Indy.
lll FORA DAS PISTAS
Se por um acaso você é daqueles que faz aniversário cinco dias antes do Natal, além de ganhar só um presente por ano também nasceu no mesmo dia que o paranormal israelense Uri Geller, o ator americano Jonah Hill e Jakie Fox, a guitarra base das Runaways, banda que não só revelou Joan Jett como também devia gostar do velho Harvey Samuel, já que adoravam brincar com fogo.
lll A Série 365 Dias Mais Importantes do Automobilismo, recordaremos corridas inesquecíveis, títulos emocionantes, acidentes trágicos, recordes e feitos inéditos através dos 365 dias mais importantes do automobilismo.