
A história da carreira de Andreas Nikolaus Lauda teve como ponto de virada o acidente em Nurburgring durante a temporada de 1976. Depois de sobreviver ao incêndio de sua Ferrari e voltar para disputar o título daquele ano, Lauda desistiu da prova decisiva no Japão por entender que as condições do tempo não eram seguras. Assim, o austríaco viu o título de campeão ir para James Hunt, em história tão lembrada pelas gerações seguintes.
Após o revés daquele campeonato, a relação de Lauda com a imprensa e a torcida italiana azedou. Pouco importava o fato dele ter escapado da morte certa e voltado às pistas. A desistência em Fuji foi vista como medo. Para piorar, o comendador Enzo Ferrari também não engoliu a atitude do austríaco. Niki, por sua vez, não engoliu o tratamento daqueles carcamanos.
Assim, o austríaco iria para a temporada de 1977, com muitas dúvidas sobre o seu real potencial, já que ainda se recuperava fisicamente do inferno vivido na Alemanha, ao mesmo tempo que não tinha a confiança da escuderia pela qual corria.

Entretanto, o conjunto ferrarista ainda aparecia como um dos melhores do grid. O carro, o 312T2, era o mesmo modelo de 1976, mas ainda tinha potencial a ser explorado. Apesar de McLaren, Lotus, Tyrrell, Brabham e a surpreendente novata Wolf terem carros interessantes a escuderia italiana ainda tinha o talento e a consistência de Lauda, que se mostrou inabalável ao longo do ano.
Lauda ganhou três corridas ao longo das 14 primeiras etapas (África do Sul, Alemanha e Holanda), mas teve seis segundos lugares. Com as quebras e acidentes dos seus rivais diretos, como James Hunt, Mario Andretti e Jody Scheckter, o desempenho mais regular do austríaco o levou para o GP dos Estados Unidos Leste, em Watkins Glen, com grandes chances de sacramentar o seu segundo título de pilotos.
Na corrida realizada em 2 de outubro de 1977, Lauda precisava levar sua Ferrari apenas dentro da zona de pontos. Um sexto lugar, que dava um mísero ponto na época, seria o suficiente para sacramentar o seu título. Mesmo que não conseguisse, bastasse apenas que Scheckter, da Wolf, não vencesse a prova. Na classificação, o piloto da Ferrari levou a melhor, partindo de sétimo, ante o nono do sul-africano.
Apesar da situação tranquila, mais um desafio, um fantasma, estava no caminho de Lauda: a chuva veio minutos antes da prova estadunidense, deixando a pista molhada. No entanto, era uma garoa fina, bem longe da tormenta que caiu em Fuji na temporada anterior.

Na largada, o pole, James Hunt foi superado pela Brabham do alemão Hans-Joachin Stuck, enquanto Scheckter tentava galgar posições. Lauda, por sua vez, partia para a tática de se manter, pelo menos o mais perto possível da zona de pontos.
No 15º giro, Stuck teve uma falha na embreagem e saiu da pista em direção ao gard-rail, pondo fim à grande atuação do alemão da Brabham. Hunt retomou a liderança e não saiu mais de lá. Mario Andretti tentou um último ataque nas voltas finais, mas o inglês estava seguro e caminhou para a vitória.

Scheckter bem que tentou, mas não conseguiu ir além do terceiro posto, imediatamente a frente do austríaco da Ferrari. Isso era mais do que suficiente para que Niki Lauda voltasse a ser campeão mundial de Fórmula 1, 427 dias após o acidente em que quase perdeu a vida.
Apesar da vitória, a festa foi bem contida em Maranello, até porque este foi o capítulo final da passagem de Lauda pela escuderia italiana. Como o austríaco estava desgostoso com todo aquele tratamento desde o final de 1976, o piloto-aviador costurou um acordo com Bernie Ecclestone ainda no meio da temporada e, sem comunicar a ninguém, acertou sua ida para a Brabham.
Não bastasse todo o estresse ao longo de 1977, Lauda ainda teve grandes divergências internas, como a contratação de Carlos Reutemann como segundo piloto naquele ano e a demissão do mecânico Ermano Coughi, homem de confiança de Niki. A gota d’água foi o anúncio de um terceiro carro da Ferrari na etapa seguinte, no Canadá, para o novato local, Gilles Villeneuve.
O austríaco não quis mais saber daquele ambiente e deixou a equipe italiana após a corrida de Glen, não disputando as provas finais em Montreal e Fuji. Enzo Ferrari se irritou com a insolência e chamou Lauda de Ebreo (judeu em italiano), de forma pejorativa. Definitivamente, não dava para ficar em um local de trabalho assim.

Lauda ficou dois anos na Brabham-Alfa Romeo, sem grandes resultados. O austríaco chegou a se aposentar, mas retornou à McLaren em 1982, disputando mais quatro campeonatos de F1 e faturando o tricampeonato em 1984. Para quem quase virou cinzas em um dos acidentes mais impactantes da história da categoria, o título de 1977 serviu para o austríaco renascer como uma fênix, demonstrando que poderia enfrentar qualquer um, tanto dentro como fora das pistas.
Fonte: Continental Circus (link 1, link 2 e link 3), Grande Prêmio e Stats F1