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SÉRIE CIRCUITOS DA F1: Paul Ricard

Nascido da ideia de um produtor de bebida, Paul Ricard conta com inúmeras opções de traçado e tem um piloto da casa como maior vencedor

A história do circuito de Paul Ricard começou com o empresário Paul Louis Marius Ricard. No começo dos anos 1910, o absinto era a bebida mais consumida pelos franceses e acabou sendo banida por seu alto teor alcoólico. Já nos anos 1920, o governo francês aprovou a venda das versões mais leves da bebida.

O empresário Paul Ricard com o pintor Salvador Dalí. – Foto: reprodução

Vendo uma chance de negócio, Paul Ricard criou uma receita da bebida feita de anis, chamando-a de Pastis. Aperfeiçoando a receita, o empresário fez sucesso com a marca Ricard, conseguindo em 1932, que o governo aumentasse a porcentagem de teor alcoólico permitido. E assim nasceu esse típico licor francês.

Criado para substituir o banido Absinto, o Pastis criado por Paul Ricard era vendido como típico produto da região de Marselha. – Foto: reprodução

E o que a bebida tem a ver com o circuito francês? Mesmo autorizados a vender, a vida dos produtores de bebidas nunca foi fácil, enfrentando várias proibições. Uma delas proibiu a propaganda de bebidas alcoólicas na França. Acostumado a patrocinar eventos esportivos, Paul Ricard encontrou uma maneira para burlar essa regra: construir um circuito e dar a ele o seu nome!

Com a ideia na cabeça, Ricard chamou os pilotos Henri Pescarolo e Jean-Pierre Beltoise para dar sugestões de traçado, já que a proposta original, feita por um arquiteto que não era familiarizado com o automobilismo, não agradou.

Jean-Pierre Beltoise foi um dos pilotos que deu suas sugestões para o traçado do circuito de Paul Ricard. – Foto: reprodução

Projeto revisto, as obras começaram em 1969 e duraram apenas 10 meses. O local escolhido ficava no sul da França, perto da cidade de Le Castellet, onde Ricard tinha construído um aeroporto para ajudar em seus negócios, hoje conhecido como Aéroport du Castellet. A pista oferecia quatro opções de traçado. O traçado de Grande Prêmio tinha duas opções: a versão estendida, de 5,809 km, ou a curta, de 3,812 km.

Vista aérea do circuito de Paul Ricard na época de sua construção, com a pista do aeroporto ao lado. As linhas internas marcam a divisão para as quatro possibilidades de traçado. – Foto: reprodução
Traçado usado em Paul Ricard na época de sua inauguração. – Foto: reprodução

No dia 19 de abril de 1970, o circuito foi inaugurado com uma corrida de carros esportivos, vencida por Brian Redman. Na época, o GP da França estava sendo disputado nos circuitos de Rouen e de Clermont-Ferrand, que tinham tomado o lugar da pista de Reims como palco da etapa francesa. Com a chegada de Paul Ricard, um circuito novo em folha e com uma excelente estrutura, não demorou muito para a F1 fechar um acordo com a nova pista.

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Guia para a corrida de 1971, que tinha como destaque o GP da França de F1 e o recorde de volta mais rápida marcada por François Cevert em 1970, durante uma corrida de F2. – Foto: reprodução

No dia 4 de julho de 1971, a F1 fez sua primeira corrida no circuito e contou com um Grand Chelem de Jackie Stewart. O francês François Cevert completou a dobradinha da Tyrell e o brasileiro Emerson Fittipaldi completou o pódio.

Completando o Grand Chelem, Jackie Stewart recebe a bandeirada para vencer o GP da França de 1971. – Foto: reprodução

Tudo parecia ir bem no circuito, que era considerado seguro devido a suas extensas áreas de escape. Isso não evitou, no entanto, que a pista presenciasse acidentes graves. Durante a corrida de 1982, Mauro Baldi e Jochen Mass se bateram e o carro de Mass voou por cima da proteção de pneus, ficando com metade presa para dentro da arquibancada, ferindo muitos espectadores. O piloto sofreu apenas queimaduras nas mãos, já que os fiscais logo apagaram o fogo do carro do piloto, mas ainda abalado pelo acidente que vitimou Gilles Villeneuve meses antes em Zolder, Mass decidiu abandonar as pistas de vez.

Fiscais tentam retirar Mass dos destroços de sua March, que ficou presa na grade da arquibancada. O piloto saiu do carro apenas com queimaduras nas mãos e Baldi não sofreu nenhuma lesão. – Foto reprodução

Já Elio de Angelis não teve a mesma sorte. No dia 14 de maio de 1986, o piloto teve um problema mecânico na curva Verrerie, quando fazia um teste pela Brabham. Seu carro capotou, acertando uma barreira e pegando fogo. Como era comum naquela época, não havia fiscais ou equipe médica suficiente em dias de testes e de Angelis não conseguiu sair sozinho do carro. Retirado do carro, o helicóptero levou mais 30 minutos para chegar e levar o piloto ao hospital em Marselha. Apenas com a clavícula fraturada e queimaduras leves nas costas, Elio de Angelis faleceu no dia seguinte devido à inalação de fumaça.

O que restou do carro de Elio de Angelis, que faleceu devido à inalação de fumaça. A situação do piloto foi agravada pela demora no resgate. – Foto: reprodução

Para evitar um novo acidente, a F1 passou a usar a versão curta do traçado de Grande Prêmio para a corrida de 1986 em diante, o que desagradou aos pilotos.

Traçado curto, que foi utilizado a partir de 1986, depois do acidente de Elio de Angelis naquele ano. – Foto: reprodução

Com outros circuitos na França, a F1 acabou migrando para Magny-Cours, com a MotoGP indo para Le Mans. Sem investimento em melhorias, o circuito acabou perdendo todas as principais categorias que disputavam etapas em sua pista. A F1 deixou de correr em Paul Ricard em 1990, levando a corrida para o circuito de Magny-Cours. O público presente pode se despedir com estilo, assistindo o piloto da casa, Alain Prost, levar a vitória.

Correndo em casa, Alain Prost comemora a vitória no GP da França de 1990, o último disputado em Paul Ricard. – Foto: reprodução

Com a morte de Paul Ricard em 1997, o circuito e o aeroporto foram vendidos em 1999 para a Excelis Company, empresa de Bernie Ecclestone, chefão da F1 na época. O plano de Ecclestone era fechar o circuito para reformas, visando transformar o circuito em uma pista de teste de alta velocidade. O processo de renovação ficou por conta de Philippe Gurdjian, que foi organizador do GP da França entre 1985 e 1997.

O chefão da F1 na época, Bernie Ecclestone, adquiriu o circuito e o aeródromo através da empresa Excelis. – Foto: reprodução

As obras terminaram em 2001 e trouxeram algumas mudanças no traçado do agora Paul Ricard High Tech Test Track, como o circuito passou a ser chamado. Numa extremidade da pista, a chicane Bendor foi removida e algumas das curvas foram renomeadas. No outro lado, a La Chicane e a Virage de l’École foram remodeladas para poder criar mais áreas de escape. Além disso, novas curvas foram adicionadas ao longo da pista, para que o circuito pudesse ter mais opções de traçado.

Na parte de segurança, a tradicional brita foi substituída por áreas de escape com asfalto de alta aderência, que podem ter várias intensidades. Essas áreas foram pintadas com faixas azuis e vermelhas, que virou a marca do circuito e divide a opinião dos fãs.

As listras azuis e vermelhas viraram marca do circuito, mas não agradaram muito aos fãs. – Foto: reprodução.

Outra mudança foi a instalação de barreiras Tec-Pro, que eram melhores do que as conhecidas barreiras de pneus. A inovação acabou sendo adotada em várias pistas e pode ter sido crucial no acidente de Alex Wurz, quando fazia um teste de pneus com a McLaren em 2005. Um pneu estourou e mandou Wurz a 304 km/h de frente contra a barreira de proteção. A McLaren ainda se arrastou por cerca de 400m, até atingir outra parte da barreira. Apesar da velocidade e violência do impacto, o piloto saiu ileso.

Por estar localizado no sul da França e ter um clima mais ameno, o circuito acabou se tornando a pista de teste da equipe Toyota, que estava a ponto de fazer sua estreia na F1. Não só a equipe podia testar em pista seca, como usar o sistema de irrigação do circuito para simular uma pista molhada.

O circuito de Paul Ricard tem um sistema de irrigação que permite molhar a pista e deixá-la com as condições encontradas na chuva. – Foto: reprodução

As reformas no circuito não pararam por aí, com mais curvas sendo adicionadas, criando ainda mais opções de traçado. Todas as mudanças deram resultado e em 2006, Paul Ricard recebeu a certificação necessária para voltar a receber corridas.

Com o certificado em mãos, o circuito começou em 2009, a voltar suas atividades para as competições, começando com corridas da FIA GT e da GT3. Para receber o público, várias arquibancadas foram construídas.

Vista aérea do circuito. Por conta da reforma, a opção de pista curta, que foi usada pela F1 entre 1986 e 1990, deixou de existir. Apesar disso, o circuito ainda possui 247 variações de traçado, para atender todo tipo de categoria. – Foto: reprodução

A área dos boxes também foi estendida, ganhando mais cinco garagens adicionais de 170 m², que fazem parte de um segundo complexo de boxes e paddock, além dos doze principais. Por conta dessa ampliação, o traçado curto teve que ser sacrificado, restando ao circuito apenas 247 variações possíveis, que vão de 828 a 5.858 metros. O circuito também tem sua pista de kart e escola de pilotagem.

Atraindo cada vez mais categorias, como a WRCC, World Series by Renault e a ELMS, não demorou muito para que a F1 voltasse ao circuito. Para isso, a pista fez mais modificações. Algumas partes da pista, como a entrada da La Verrerie, da Virage du Camp e da Virage du Pont foram alargadas. A pista também ganhou uma nova camada de asfalto.

Traçado remodelado para a volta da F1 ao circuito. – Foto: reprodução

Usando a variação 1C, a F1 voltou ao circuito de Paul Ricard no dia 24 de junho de 2018, com a vitória de Lewis Hamilton, que também venceu a edição de 2019. Não só a corrida de 2018 marcou o retorno de Paul Ricard à F1 depois de 18 anos de hiato, mas também marcou a volta do GP da França ao calendário da categoria depois de 10 anos, quando a F1 corria no circuito de Magny-Cours.

Confira uma volta em Paul Ricard aqui!

Entre as corridas de 2018 e 2019, o traçado passou por mais uma mudança. Depois da reclamação dos pilotos, a entrada do pit lane foi mudada, com os carros agora entrando na saída da Virage du Lac, enquanto a saída foi estendida e agora fica na entrada da curva Pinède. O circuito também ganhou um terceiro paddock e uma torre de cronometragem.

Vinte e cinco pilotos franceses já tiveram a chance de correr em Paul Ricard. Na primeira corrida, em 1971, cinco pilotos alinharam no grid: Jean-Pierre Beltoise, Max Jean, François Mazet, Henri Pescarolo e François Cevert, que foi o melhor colocado dos cinco, chegando em 2º lugar.

François Cevert (à direita) foi o piloto francês mais bem colocado na primeira corrida de F1 disputada em Paul Ricard, chegando em 2º. – Foto reprodução.

Já Alain Prost foi o piloto mais bem sucedido correndo nessa pista. Em nove corridas, o tetracampeão venceu quatro delas, com Mansell e Hamilton em 2º, com duas vitórias cada.

Alain Prost comemora sua primeira vitória em Paul Ricard, em 1983. O francês tem quatro vitórias no circuito, sendo o piloto que mais venceu nessa pista. – Foto reprodução

Prost não foi o único piloto francês a vencer em Paul Ricard, já que René Arnoux também triunfou em 1982.

Quando se fala em número de pódios, Prost novamente aparece no topo da tabela, com oito aparições, seguido de Nelson Piquet com 4 e Hunt, Mansell e Hamilton, com 3 cada. Entre os pilotos franceses, seis deles já conseguiram subir no pódio. Além de Prost e Arnoux, Pironi, Depailler, Laffite e Cevert também já tiveram a honra.

Pódio totalmente francês na corrida de 1982. René Arnoux (centro) foi o vencedor, com Prost em 2º (à esquerda) e Didier Pironi (à direita) chegando em 3º. O 4º colocado, Patrick Tambay, também era francês. – Foto reprodução

Entre os pilotos brasileiros, oito já correram na pista francesa. Emerson e Wilson Fittipaldi, Carlos Pace, Nelson Piquet, Raul Boesel, Chico Serra, Ayton Senna e Maurício Gugelmin. Dentre eles, Piquet é o que tem o melhor resultado, após vencer a corrida de 1985. Em 1990, Gugelmin quase conseguiu a proeza de subir no pódio com junto com seu companheiro de equipe na Leyton House, mas abandonou a corrida na volta 53, com Capeli chegando em 2º após perder a liderança nas voltas finais. Para se ter uma ideia da proeza, a Leyton House nem tinha se classificado para a etapa anterior e abandonos duplos eram comuns na equipe.

Entre os pilotos brasileiros, Nelson Piquet é o mais bem sucedido, com uma vitória e quatro pódios. – Foto reprodução

E a pista é especial para dois pilotos. Foi em Paul Ricard, em 1973, que Ronnie Peterson conseguiu sua primeira vitória na F1. Já James Hunt marcou seus últimos pontos ao subir no pódio em 1978, antes de abandonar a F1 no ano seguinte.

O grid atual tem dois pilotos que correm em casa em Paul Ricard. Gasly tem um 7º lugar, conquistado em 2021, como melhor resultado, e Esteban Ocon não passou da primeira volta em 2018, quando colidiu logo depois da largada justamente com Gasly e foi apenas o 14º na corrida do ano passado.

E pode ser a última chance dos dois pilotos que correr em casa, já que o contrato do circuito com a F1 acaba em 2022 e com novas pistas sendo adicionas, o GP da França corre o risco de ficar de fora do calendário.

Esteban Ocon (na foto com Alain Prost), terá mais uma chance de conseguir um melhor resultado correndo em casa. Foto: reprodução.
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