– Tá bom, Velho, explica aí como a estratégia da equipe pode ser tão importante assim – perguntou o Químico.
– Deixa só eu pedir mais uma. Ô comandante, desce mais duas geladas aqui!
Estavam já há algumas horas jogando conversa fora no Buraco do Padre, o boteco da esquina. Muita coisa acontecendo em volta, mas os cinco cabeças de gasolina estavam monotemáticos naquele dia.
– Aposto que ele vai falar da Ferrari. O Velho e o Visconde só querem saber da Scuderia.
– Pô, Coelho, vamo ouvir a história.
– E vou mesmo – disse enchendo o copo. – Melhor exemplo de como a estratégia pode ganhar uma corrida é o GP da Hungria de 98.
– Ahhhhhh! – em uníssono.

– Sabia que ele iria falar do queridinho dele.
– Caraca, mas o que o Schumacher e o Ross Brawn fizeram naquele dia foi mágico.
– Magia mágica na corrida magiar.
– Falou e disse, Chefe! Espera aí, Velho, não tá fazendo 20 anos hoje essa corrida? Foi num 16 de agosto!
– Putz, acho que é isso mesmo, Visconde! Sei que a nossa Rossa tava numa situação difícil. A F300 tava tomando um banho da McLaren MP4-13, e o Schumi sofria 16 pontos atrás do Mika Häkkinen depois da dobradinha dos caras na Alemanha.
– E ele e o Coulthard fecharam outra dobradinha na primeira fila em Hungaroring, falou o Químico.
– Pois é. Schumacher largava em terceiro, e o imprestável do Eddie Irvine nem sequer conseguiu ficar ao lado, perdeu pro Damon Hill na classificação!
– Só que na largada ele conseguiu passar, né não?
– Conseguiu, Coelho, mas com as duas McLaren estilingando na frente, parecia que não ia ter jeito. Circuito travado, carro pior… O Coulthard ficou prá trás segurando o alemão enquanto o Mika abria facinho quatro segundos.
O Visconde só ria. – Aquele lá tinha a bandeira da Finlândia na camisa. Já tinha até assumido que iria ajudar o companheiro no campeonato.
– E tava certo – falou o Chefe. Mika era um homão da pega. Só não tinha acabado o campeonato ainda porque as McLaren não tavam muito confiáveis, quebravam mais que suspiro tailandês feito com leite de cabras de Capri num mosteiro de Madagascar.
– É, mas não dava prá confiar na quebra. Nem no Irvine, aquele inútil. Todo mundo iria prá duas paradas, e chegaram a pensar em deixar o irlandês na pista com uma só, prá dar uma segurada nos adversários, mas foi só abrir os pits e ele foi o primeiro a correr lá prá dentro.
– É o que eu sempre digo, irlandês bom só o U2. E o Irvine quebrou na volta 13, afinal a Ferrari é da FIAT, né?
– Sou mais o Thin Lizzy, Coelho, e as McLaren também não tavam lá grandes coisas. Depois da primeira janela de pits, na volta 28, diminuía a distância entre Coulthard/Schumacher e o Häkkinen.
– Mas é porque o finlandês tinha um problema mecânico, Velho. E o Schumacher nem conseguia passar o Coulthard. Eram quantas voltas nessa corrida mesmo?

– 77, Químico. E daí veio a ideia genial do Ross Brawn. Mudar a estratégia do Schumacher prá três paradas, em vez de duas. Ele chamou o piloto no rádio, explicou o plano e o alemão só respondeu “OK”.
– Pô, mas daí ia ficar complicado prá chegar na frente!
– Ele conhecia o material humano que tinha, Coelho. Na volta 42, bem antes do previsto, o queixudo entrou nos boxes, trocou pneus, botou só dois real de gasolina e saiu feito um doido.
– Falando em reabastecimento, tá na hora de trocar as garrafas. Ei, consagrado, traz mais duas!!!
– Boa, Chefe.
– Pede uma batata frita.
– OK, você venceu, batata frita.
– Como também – disse o Químico. Velho, mas as McLaren pararam logo depois, não foi?
– Foi sim. Mika na 44 e Coulthard na 46. Acontece que o Schumacher já tinha começado a voar na pista, e como os dois carros prateados encheram o tanque para ir até o final, o alemão ficou com o nariz pro vento. Ross Brawn voltou ao rádio e disse alguma coisa como “estamos em primeiro, mas eles não param mais. Você tem que abrir 25 segundos nas próximas 19 voltas se quiser ganhar essa corrida”. E o filho da mãe só respondeu “muito obrigado”.
O Visconde estava com um sorriso de orelha a orelha lembrando. – E o desgraçado abaixou a cabeça e pisou como se estivesse fazendo volta de classificação. Ele tirava 1,2 e até 1,3 por volta!
– Só que o Mika continuava com o carro ruim e o Coulthard demorou prá passar ele e tentar alguma coisa.
– Verdade, Químico. Só que o Schumacher também errou. Na volta 52 ele forçou demais numa curva e foi passear na grama. Sorte que conseguiu voltar, mas perdeu três segundos nessa brincadeira.
– Acabaram não fazendo falta – falou o Coelho, felizão com as batatas chegando na mesa.

– Não fizeram mesmo. A 15 voltas do fim, com 27 segundos de vantagem pro Coulthard, a Ferrari fez outro belo pit stop e devolveu o alemão na liderança. O cara ainda continuou naquele ritmo e ganhou a corrida com mais de 9 segundos de vantagem pro escocês.
– É, foi uma bela pilotagem. E com o Häkkinen se arrastando e terminando só em sexto, ele diminuiu a diferença no campeonato prá só sete pontos.
– Isso aí. Uma das melhores corridas da história do Schumacher, graças a ele e à estratégia da equipe. Viu só, Químico? Agora enche meu copo.
– Acabou. Peraí que vou pedir outra. Ô meu camarada, traz mais duas…
lll FORA DAS PISTAS
Foi num 16 de agosto que Pete Best deixou de entrar para a história, ao ser dispensado dos Beatles, que logo chamaram Ringo Star para ocupar o banquinho do baterista. Essa data também marca o aniversário de Henry Charles Bukowski, carteiro, bêbado, poeta e um dos maiores escritores que já viveram. Falando em grandes escritores, Millôr Fernandes também faria aniversário hoje. Na seara do cinema, parabéns para James Cameron, o cara por trás de Titanic, O Exterminador do Futuro 2 e Avatar, Steve Carell, o Virgem de 40 anos e o nosso hilário Oscarito. E na música, completam translações Madonna, Matt Lukin, o baixista do Mudhoney, e o dono da Camisa de Vênus Marcelo Nova, que não matou nenhuma santa francesa.