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O primeiro Haas a pisar na Fórmula 1

Série 365: O primeiro Haas - 02ª Temporada: dia 282 de 365 dias. Por: Eduardo Casola Filho

Hoje em dia muitos relacionam o nome à Haas à escuderia de Fórmula 1 e à equipe associada com Tony Stewart na NASCAR. O empreendimento de Gene Haas, o principal empresário em fabricação de ferramentas e máquinas operadas por comando numérico computadorizado (CNC) é um dos mais notórios no automobilismo atual. No entanto, a história do esporte a motor teve outro representante marcante com o mesmo sobrenome, mesmo que ambos não tivessem nenhum grau de parentesco.

(Sportingnews.com)

Carl A. Haas, considerado um dos mais importantes chefes de equipe nos Estados Unidos, construiu uma das estruturas mais dominantes da Fórmula Indy nos anos 1980, 90 e 2000, tendo em seus carros alguns dos pilotos mais consagrados da história do automobilismo.

Vindo de uma família de origem judia, Carl nasceu em 26 de fevereiro 1929, em Chicago e ainda na juventude já trabalhava vendendo caixas de câmbio na garagem de casa. Assim, foi só um passo para iniciar sua jornada no automobilismo. Em 1952, participou como piloto de provas pela região do norte central dos Estados Unidos, competindo com carros de marcas famosas, como Ferrari, Porsche, MG e Jaguar. Haas venceu dez corridas no circuito de Milwalkee como ponto alto. No entanto, ele resolveu deixar as pistas em 1962.

Mas esta estava longe de ser o fim da sua trajetória no automobilismo, era praticamente um novo começo. Carl fundou sua própria equipe e passou a participar em algumas categorias importantes nos Estados Unidos, como a Fórmula Super Vee, Fórmula 5000 e a Can-Am. Além disso, atuou no ramo de importação de automóveis, tornando-se representante oficial da Lola Cars em território norte americano.

Entre os anos 1960 e 1970, pilotos de renome Jackie Stewart, Alan Jones, Jacky Ickx, Peter Revson, Patrick Tambay, entre outros. A Haas chegou a ter uma parceria com a equipe de Travis Carter na década de 1970, mas sem grande destaque.

Todavia, o início da fase vitoriosa viria na década de 1980, mais precisamente no ano de 1983. Carl se associou ao consagrado ator e cabeça-de-gasolina inveterado Paul Newman, fundando assim a Newman-Haas Racing para disputar a Indy. O desafio seria com um chassi Lola e o piloto ninguém menos que Mario Andretti.

Carl Haas e Paul Newman: uma das duplas mais marcantes do automobilismo (NBC Sports)

Apesar do ator ser o grande chamariz em termos de publicidade, a função de Newman era mais administrativa, até por conta do calendário apertado do artista. Assim, era Haas o cara que mais aparecia nas pistas para chefiar a equipe. E no paddock, a figura de Carl tornou-se notória, especialmente pelo enorme charuto que exibia. Embora não pudesse fumar na área de boxes (proibição da organização para evitar algum incêndio), o dirigente não deixava de portar sua tira de tabaco, mesmo que apagada.

Assim sendo, a primeira temporada da equipe foi bem positiva. Andretti venceu duas provas (Road America e Las Vegas), terminando o ano em terceiro no campeonato de pilotos. Se a estreia foi bem interessante, o segundo ano foi ainda melhor: Mario venceu cinco etapas e, com 176 pontos, sagrou-se campeã da Indy em 1984.

Com o sucesso repentino na Indy e com a solidez da parceria com a Lola, Carl vislumbrou o próximo passo. Com o apoio da companhia de ramos alimentícios Beatrice e com o apoio da Lola e da Ford, a próxima empreitada de Haas seria uma equipe de Fórmula 1. Para encarar a categoria eurocêntrica, o dirigente buscou nomes experientes, como Teddy Mayer (na chefia da equipe), Alan Jones e Patrick Tambay (dupla de pilotos).

Projeto grandioso, mas que não vingou (Projeto Motor)

Com um grupo gabaritado e um investimento pesado, as expectativas da equipe Lola-Haas eram grandes. A escuderia preparou o terreno em 1985, participando de algumas provas na parte final daquela temporada, com apenas um carro para Jones, mas não terminou nenhuma prova.

Enquanto o propulsor turbo da Ford ainda não ficava pronto, a Lola-Haas usou até o início de 1986 os motores Hart para participar regularmente da temporada 1986. O resultado? Um desastre. O conjunto mostrou-se pouco resistente, e com desempenho apenas de meio de pelotão.

Para Tambay, a temporada foi marcada por dois acidentes: uma capotada em Mônaco e uma pancada forte na volta de instalação no grid de largada em Montreal, que deixou o francês fora da etapa dos Estados Unidos, dando lugar a Eddie Cheever.

Jones, já longe da forma física ideal, não foi muito melhor, com muitos problemas e acidentes, o desempenho da esquipe anglo-americana foi bem decepcionante. Apenas um quarto e um sexto lugar do australiano (Osterreichring e Monza, respectivamente) e um quinto de Tambay (também na Áustria) garantiram um frustrante oitavo lugar nos construtores.

Com o fiasco nas pistas, a Beatrice cortou o patrocínio e, para não gastar os tubos em um projeto tão complexo dentro da F1, Carl decidiu vender os ativos da escuderia para Gerard Larousse e deixou a categoria. Daí por diante o foco voltou a ser a Indy.

De volta aos States, a equipe da Indy estava entre as mais fortes da categoria, com Mario Andretti andando na frente, ainda que os resultados nem sempre foram favoráveis. Em 1989, a Newman-Haas abriu um segundo carro para abrigar o rebento da família ítalo-americana, Michael.

Com a família Andretti, foram tempos de vitórias e algumas glórias (Projeto Motor)

Com os dois carros, houve uma mudança de hierarquia, com o jovem Michael Andretti assumindo o protagonismo na luta pelas vitórias e no arrojo nas pistas. Com o estilo audacioso arrebatando o coração dos fãs estadunidenses, Michael faturou o título da Indy em 1991 e chamou a atenção da McLaren para correr na F1 em 1993.

Com a saída do principal astro, a resposta de Carl Haas foi pesada: aproveitando o fato de Nigel Mansell ter deixado a Williams, mesmo após ser campeão do mundo em 1992, e sem espaço em uma equipe de ponta, o Leão rumou para os Estados Unidos para correr pelo Lola-Ford alvinegro na Indy.

E a participação do britânico em 1993 foi histórica. Alternando atuações brilhantes com patacoadas homéricas, Mansell teve um duro duelo com a Penske de Emerson Fittipaldi, mas o conjunto mais equilibrado e as vitórias esmagadoras do inglês garantiram o título daquele ano. Inclusive o Leão teve a primazia de manter por exatamente uma semana a marca de campeão da F1 e da Indy ao mesmo tempo.

Com Mansell, um time fenomenal (Grande Prêmio)

Depois do período de glórias, um momento de ostracismo. Em 1994, o campeonato foi decepcionante, sem nenhuma vitória. Mario Andretti se aposentou no fim do ano e Mansell retornou para a F1, já na parte final da carreira. A Newman-Haas trouxe Michael Andretti, de volta após o fiasco na McLaren e uma passagem pela Chip Ganassi, para liderar a equipe.

Em 1995 Michael e Paul Tracy, em rápida passagem pela equipe, tiveram bons resultados, mas também alguns acidentes, que os afastaram da briga pelo título. No ano seguinte, Christian Fittipaldi vinha para o lugar do canadense e a Newman-Haas chegou a sonhar com o título, mas Andretti teve que se contentar com o vice-campeonato. (Vale lembrar que aquela era a primeira temporada após a cisão da CART, categoria na qual Haas era um dos principais dirigentes, com a IRL)

Em 1997, a escuderia de Carl e de Paul Newman encerrou a longa parceria com a Lola e passou a usar os obscuros chassis Swift. Os descendentes dos clãs Andretti e Fittipaldi bem que tentaram nos anos seguintes, mas não conseguiram manter resultados competitivos. Christian em particular sofreu com acidentes fortes e perdeu várias corridas por lesões, sendo substituído em algumas provas por Roberto Pupo Moreno.

O ponto mais lembrado nesse período ocorreu em 1999. Durante os treinos para a etapa de Motegi, no Japão, Michael Andretti se enroscou com Juan Pablo Montoya, da Ganassi e ambos bateram forte. Carl se irritou e tentou tirar satisfações com o colombiano. Chip Ganassi tentou contê-lo, mas levou uma charutada de Haas.

Em 2000, a escuderia voltou a usar chassis Lola, mas os resultados não vieram. Michael cansou da situação e mudou-se para a Green (aonde tornou-se acionista e viraria o dono definitivo da equipe), encerrando definitivamente a passagem do clã Andretti pela Newman-Haas.

A equipe mudou outras coisas em 2001. Além da troca dos motores Ford pelos Toyota, veio o brasileiro Cristiano da Matta. Com uma dupla tupiniquim, a primeira temporada foi chea de altos e baixos, mas com o êxodo de algumas equipes da CART para a IRL, o mineiro se aproveitou bem e venceu de forma dominante a temporada de 2002.

Cristiano da Matta foi o brasileiro mais bem-sucedido na Newman-Haas (Projeto Motor)

Da Matta foi para a F1, para o projeto da Toyota, enquanto Christian Fittipaldi rumava para a NASCAR. Em 2003, a Newman-Haas apostou no também mineiro Bruno Junqueira, há dois anos na CART, e no francês Sebastien Bourdais, campeão da Fórmula 3000 no ano anterior. A escuderia também voltava a usar motores Ford, com a saída da montadora japonesa da CART.

Na temporada de 2003, Junqueira terminou com o vice-campeonato e o francês foi o quarto, naquele que foi o último da CART. A categoria faliu e ressurgiu com a alcunha de ChampCar. Na nova fase, foi a vez de Bourdais arregaçar as mangas e iniciar um império do automobilismo estadunidense.

Embora o nível da ChampCar entre 2004 e 2007 tenha sido bem inferior ao da IRL no período, a Newman-Haas demonstrou a firmeza e Bourdais, correndo com o patrocínio do McDonalds, tornou-se o grande nome da categoria, vencendo 28 corridas em quatro anos e faturando o tetracampeonato. Inclusive, no último ano, a equipe teve um terceiro parceiro: o empresário Mike Lanigan deu um apoio nas finanças.

Domínio de Bourdais foi, curiosamente, o último momento de domínio da equipe (ESPN)

A fase de bonança, no entanto, foi chegando ao fim. Em 2008, a ChampCar foi absorvida pela IRL, formando a atual IndyCar Series. Bourdais foi arriscar a sorte na F1 pela Toro Rosso, enquanto a equipe mantinha Graham Rahal (filho de Bobby), que estava na escuderia em 2007. Para a vaga de primeiro piloto, o escolhido foi Justin Wilson.

Com a Indy unificada novamente e a utilização dos chassis Dallara em detrimento dos Panoz, usados em 2007 na ChampCar, a Newman-Haas/Lanigan sentiu o baque e deixando de frequentar a ponta. Rahal e Wilson venceram uma corrida cada. O triunfo do britânico, em Detroit, acabou por ser o último da equipe na história.

Para piorar as coisas, a morte de Paul Newman em 2008 foi um golpe pesado na organização. Mesmo com Carl ainda sendo o responsável na parte operacional, a fuga dos patrocinadores deixou as equipes em maus lençóis. Após a temporada de 2010, Mike Lanigan mudou-se para a Rahal-Letterman deixando a Newman-Haas na pindaíba.

Em 2011, o espanhol Oriol Servia e o canadense James Hinchcliffe tiveram uma temporada com resultados razoavelmente dignos, mas no fim do ano, o dinheiro acabou. Com a mudança de regulamento e com os novos chassis Dallara mais caros, era necessário obter um patrocínio. A escuderia chegou a fechar um acordo com a Lotus e com Jean Alesi para correr as 500 milhas de Indianápolis, mas a falta de dinheiro pesou e a Newman-Haas deixou as competições definitivamente.

Oriol Servia no cantar do cisne da Newman-Haas (Newman-Haas)

Além do desfecho melancólico nas pistas, Carl ainda passou a sofrer com os efeitos do Mal de Alzheimer. O dirigente mudou-se para a pequena cidade de Lake Forest, Illinois para ter uma vida tranquila ao lado da esposa Bernadette. Em 29 de junho de 2016, Haas veio a falecer, sendo velado e enterrado em cerimônias apenas para os familiares. Apenas no dia 7 de julho, a viúva anunciou a morte de Carl.

Apesar de um desfecho triste, o legado deixado por Carl Haas foi grandioso. A equipe na Fórmula Indy teve nada menos que 107 vitórias e oito títulos da categoria, marca superada apenas pelas gigantes Penske e Chip Ganassi. O nome do dirigente foi incluso no hall da fama da SCCA em 2007 e toda a comunidade automobilística dedicou seus tributos a um dos nomes mais importantes do esporte a motor nos Estados Unidos.

Fonte: Motorsport.com, Grande Prêmio, Wikipédia

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