A Automobil Verkehrs und Übungs-Straße (algo como “Estrada para Tráfego e Testes de Automóveis”), obviamente ficou conhecida por seu acrônimo, AVUS.
Mas não só por isso: um circuito de 8,3km que só tem quatro curvas, uma sendo um grampo e as outras três numa rampa inclinada não é exatamente algo que vejamos sempre por aí.
Na verdade, chamar de circuito é uma licença poética hoje em dia (como foi feito neste texto do BP BEATS). Como o próprio nome já indica, trata-se de uma via pública nos arredores de Berlim, que foi aberta em 1921, e no início era liberada ao público que quisesse testar seus automóveis ao preço de 10 Marcos.
Quando foi aberta pela primeira vez, tinha 19km e meio, com duas retas paralelas de quase metade da distância total unidas nas pontas por curvas de quase 180 graus com raio longo e leve inclinação de cinco graus. Suas retas eram utilizadas também para o trajeto entre Berlim e Potsdam, fazendo dela a primeira autobahn da história.
O pessoal das motocicletas adotou rapidamente o circuito, porém apenas em 1926 o primeiro evento para carros de turismo aconteceu por lá, no dia 11 de julho. E já começou cobrando seu preço de sangue, com um acidente ainda nos treinos que acabou por encurtar a vida de um mecânico. Na corrida, sob chuva forte (povinho maluco, hein?), Adolf Rosenberger perdeu o controle do seu veículo e atropelou três fiscais de pista, matando dois na hora e outro no hospital. Este primeiro evento oficial foi vencido por um velho conhecido de quem acompanha o projeto dos 365 dias, Rudolf Caracciola.
Com um saldo tão negativo, o automóvel clube alemão resolveu levar suas provas para o circuito de Nürburgring, enquanto a AVUS ficava servindo de “pista de decolagem” para dragsters da época – inclusive sendo palco do então recorde de velocidade atingido até 1928, de 238 km/h.
Ainda erraticamente recebendo carros de corrida, em 1936 a AVUS foi palco de provas dos Jogos Olímpicos como o ciclismo e a maratona.
Em 1937 foi construída a famigerada rampa norte, conhecida depois como “The Wall of Death”. Era uma curva inclinada – aliás, beeeem inclinada. Para efeitos de comparação, enquanto o santuário em Indianápolis tem uma inclinação de 11°, e o circuito de Daytona impressiona com seus 31°, a louca estrada germânica tinha 43° de inclinação em sua ponta norte – sem problema de poças d’água por lá, pelo jeito. A “Parede da Morte” era feita de tijolos e não tinha anteparo – ou seja, caso você se perdesse, poderia muito bem só aterrissar na Polônia.
Após a guerra, o trecho voltou a ser utilizado para provas das Fórmulas 2 e 3, com a pista sendo reduzida para os cerca de 8 quilômetros usuais. Em 54, um Grande Prêmio de Berlim de Fórmula 1, não válido para o campeonato mundial, foi realizado e dominado pelas Mercedes de Karl Kling e Juan Manuel Fangio.
E, em 1959, finalmente a AVUS participou do mundial. A retirada da Mercedes após o acidente em Le Mans associada à localização da pista (ainda não tínhamos o muro de Berlim, então os espectadores poderiam vir de ambas as Alemanhas, enquanto Nurburgring ficava muito próximo da borda ocidental.
O Grande Prêmio da Alemanha de 1959 aconteceu num dia 02 de agosto, e foi marcado pela morte do francês Jean Behra que perdeu o controle de seu Porsche na rampa norte e atingiu um mastro de bandeira.
A corrida, disputada pela única vez na história em duas baterias e, no agregado de resultados, tivemos uma trinca da Ferrari: Tony Brooks em primeiro, seguido de Dan Gurney e Phil Hill. Jack Brabham abandonou por problemas mecânicos e viu sua liderança no campeonato diminuir para apenas 4 pontos, com Brooks encostando na disputa.
A morte de Behra lembrou novamente os organizadores da falta de juízo que era colocar um monte de malucos correndo de carro por lá, e a Fórmula 1 nunca mais volto à AVUS.
As rampas do mundo todo acabaram sendo proscritas e restritas a circuitos ovais, e a parede da morte foi destruída em 1967, dando lugar a uma torre de comando do alto da qual percebeu-se enfim que a grande reta era um tanto quanto torta.
O circuito continuou por algum tempo recebendo eventos da Fórmula 3 e da DTM, até que a magia de grandes retas foi minguando, enquanto o intenso trânsito da rodovia foi tornando cada vez mais problemático fechar a estrada para corridas de carro. Finalmente, em 1999 foi realizada uma corrida/evento com veteranos e a histórica, excêntrica e sanguinária AVUS teve seu fim.
FORA DAS PISTAS
Em 1934, quando a AVUS estava em plena atividade, Adolf Hitler recebeu o título de führer da Alemanha, em um 02 de agosto. Nasceram nesta data Peter “Lawrence da Arábia” O’Toole, o pai de Freddy Krueger, o diretor Wes Craven, “Butch” Vig, o produtor responsável por Nevermind, do Nirvana e Pete De Freitas, baterista do Echo & the Bunnymen.
O outro aniversariante do dia é Jim Capaldi, metade da banda Traffic e pertencente ao Rock and Roll Hall of Fame. Fiquemos com uma dançante “Gimme Some Lovin’”, gravada ao vivo em 1994.