A F1 anunciou que Miami iria receber a categoria em 2022. Mas a cidade já tem uma longa história em receber corridas em suas ruas.
Nos anos 1980, Ralph Sanchez foi o responsável por levar o automobilismo para a cidade. Em 1983, a IMSA fez sua estreia em um circuito de rua, algo que depois foi adotado pela categoria nos anos seguintes.
A primeira pista foi construída na região da Biscayne Boulevard, passando pelo Harbor de Bayfront Park, área central e turística da cidade. A corrida acabou sendo um fiasco devido à chuva, que interrompeu a prova depois de 27 voltas, mas o trabalho da organização garantiu a continuidade da corrida. Para fazer o público retornar, Sanchez tirou Emerson Fittipaldi da aposentadoria para participar da corrida.
Em 1986, a IMSA teve que correr em outro circuito, por conta de obras de desenvolvimento no Bayfront Park. Boa parte da pista acabou ficando no Bicentennial Park, o que facilitou a construção dos boxes e paddock.
A categoria ficou no circuito até 1994, com a Trans-AM fazendo o último evento no circuito, que ainda viu uma única aparição da CART em 1995. Enquanto as corridas foram para Homestead-Miami Speedway, boa parte do antigo circuito acabou sendo destruído para a construção da American Airlines Arena. Mais tarde, outra parte do circuito desapareceria com a construção de dois museus no lugar.
Nem tudo estava perdido para a região de Bayfront. Em 2002, a ChampCar e a ALMS fizeram um evento, usando parte da Biscayne Boulevard que fez parte do traçado original. A corrida da ChampCar teve a vitória do brasileiro Cristiano da Matta. Com a pista lenta e inadequada, as corridas não atraíram muito a atenção do público, mesmo com uma mudança no traçado feita em 2003. Por conta disso, as corridas foram para outras pistas em 2004.
Em 2015, a região central de Miami ganhou mais uma oportunidade, com a Formula E desembarcando na cidade em um traçado que rodeava a American Airlines Arena. Novamente problemas com a localização do circuito acabaram com a corrida na cidade.
Durante todos esses anos, o objetivo de Miami era receber a F1 e em 2018, os promotores começaram a se mexer para fazer a corrida acontecer. A cidade começou recebendo um evento para a F1 e logo apresentou o traçado que seria usado nas corridas. A pista novamente ficaria localizada no centro, começando em Bayfront Park. Só que o desenho do traçado não agradou aos pilotos e muito menos aos moradores, que começaram a se opor à realização da corrida naquela área.
Os protestos foram em vão, já que a Comissão da Cidade de Miami aprovou um acordo para receber a corrida por 10 anos, com a opção de extensão por mais dez e ainda sem pagar as taxas que a Liberty cobra dos circuitos. Claro que os demais circuitos não gostaram da isenção da taxa e juntando com a pressão dos moradores, a Comissão decidiu adiar a decisão final sobre a corrida.
Vendo que fazer a corrida na área central de Miami, como era anos 1980, não ia dar certo, Stephen Ross, um dos promotores da corrida sugeriu construir a nova pista na área do Hard Rock Stadium, casa do time da NFL Miami Dolphins e que pertencia a ele. Com bastante espaço, graças aos amplos estacionamentos, a Apex, responsável por criar o traçado, passou dias analisando todas as possibilidades. No começo, os projetistas criaram 75 versões de traçado, que depois foram reduzidas para 36, que foram colocadas à teste em simuladores.
Traçado escolhido, logo a realização da corrida começou a enfrentar problemas com os moradores. Uma parte do traçado passaria pela rua 199th e os moradores mostraram preocupação com o trânsito e barulho que a corrida causaria.
Os moradores de Miami Gardens, local em que a pista seria construída, também entraram na justiça contra a prefeitura de Miami e o prefeito Carlos Giminez, por discriminação racial. O bairro de Miami Gardens tem uma população predominantemente preta, que foram sendo expulsos dos demais bairros até se alojarem na região, longe do centro da cidade e da região praiana, áreas que atraem mais turistas. E para não perturbar os moradores do bairro mais nobre do centro da cidade, a corrida estava sendo realizada em Miami Gardens, sem se importar com seus moradores, que não só eram contrários à realização da corrida, mas também foram contra a construção de estádios na região, como o que o jogador David Beckham planejava construir.
A pandemia de Covid-19 acabou atrasando a entrada de Miami no calendário e nesse meio tempo, o traçado foi revisado para que não passasse pela rua 199th.
Além disso, Stephen Ross e o prefeito Rodney Harris fizeram um acordo, que destinaria 5 milhões de dólares nos próximos dez anos para os moradores e comerciantes locais, que teriam prioridade para se tornarem vencedores oficiais na corrida. Um programa para encorajar o estudo de matérias STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática) também seria criado, oferecendo estágios remunerados na área para alunos do ensino médio e universidades. O circuito também se comprometeu em instalar barreiras para reduzir o som e monitorar a qualidade do ar durante o fim de semana de corrida.
Em abril de 2021, o GP de Miami foi finalmente aprovado e um acordo foi assinado por dez anos, com a corrida prevista para o segundo trimestre de 2022. Com a corrida recebendo a luz verde, as obras começaram já com uma dificuldade. As obras do circuito não podiam atrapalhar o funcionamento do estádio e nem as obras do novo complexo de treinamento dos Dolphins. A rede de drenagem que já existia no local também foi uma dificuldade para os projetistas, já que ela teria que suportar o aumento no escoamento da água.
Não só a pista foi construída do zero, mas também as estruturas de arquibancadas, área de fãs e prédios administrativos. Assim como ocorre em alguns circuitos de rua, os boxes serão permanentes e foram concluídos em janeiro de 2022.
O Miami International Autodrome, como foi batizado o circuito, terá 19 curvas de alta e baixa velocidade, com algumas elevações criadas no traçado. A pista ainda contará com 3 zonas de ativação de DSR. O Hard Rock Stadium ficará no centro da pista, com os boxes ficando na parte norte do estádio.
O circuito também chamou a atenção pelo luxo. Uma praia artificial foi construída no circuito, com ingressos que custam 1000 dólares para ter acesso à areia ou 2000 dólares para ter acesso à piscina construída no local. Para quem quiser mais luxo, uma marina foi construída no local, patrocinada por empresas de iates, já que Miami é rodeada de água e é comum ver casas com marinas particulares pela cidade. Além disso, o circuito vai trazer diversos clubes e espaços de hospitalidade. Só a equipe McLaren já confirmou cerca de 1000 convidados para a corrida, incluindo muitas celebridades. Nem mesmo as arquibancadas escaparam dos preços altos, com o ingresso para o fim de semana chegando a custar mais de 1000 dólares.
Na parte de alimentação, muitos dos espaços VIP contarão com Chefs vencedores do Prêmio James Beard (prêmio dado anualmente aos melhores chefs) e restaurantes de luxo. No total, os presentes no circuito terão mais de 30 opções, entre restaurantes e food trucks. Desse total, apenas 14 são de donos vindos de minorias.
Mesmo com as obras quase finalizadas e a corrida inaugural marcada para acontecer no dia 8 de maio de 2022, os moradores de Miami Gardens continuavam na Justiça, tentando barrar a realização da corrida por conta do barulho, que poderia causar danos à saúde dos moradores. Um estudo independente dizia que o som causado pelos carros de F1 poderiam chegar a 95 decibéis em casas a cerca de 4 km do circuito, o que seria semelhante ao barulho de uma serra elétrica. Em uma audiência feita um mês antes da corrida, o juiz responsável colocou o caso em recesso, dizendo que qualquer afirmação de dano era apenas especulação e sugeriu aos moradores que usassem tampões de ouvido ou saíssem de casa no momento da corrida. O processo ainda poderá ser retomado, depois da realização da primeira corrida, com os níveis de ruído sendo medidos.