Nada como um dia após o outro, ou melhor, uma corrida após a outra. 2017 começou de forma tímida na Fórmula 1, com um verdadeiro jogo de xadrez entre Mercedes e Ferrari em solo australiano. As provas mais táticas também agradam os cabeças de gasolina, entretanto, um olho menos treinado ignora esse aspecto e foca apenas na movimentação em pista. Passamos duas semanas escutando críticas, ofensas e questionamentos sobre o futuro da categoria, um reinado curto da patrulha da corrida chata, que durou até às 3 da manhã do último domingo (9).
É praticamente impossível não ter uma visão poética sobre as corridas de madrugada, já que passamos por uma verdadeira batalha para alcançá-las. Cancelamos compromissos no dia seguinte, escolhemos nossas armas, sejam elas café, energéticos ou até mesmo um alarme, e torcemos para dar certo. Não escolhemos assistir um GP da China, nós merecemos. Também por isso, o sentimento de redenção é multiplicado exponencialmente quando uma dessas provas nos fazem pular no lustre em plena madrugada e quase acordar os vizinhos ao redor. Em 1:37:36.158 de corrida em Shanghai, os principais argumentos da patrulha foram respondidos de maneira incontestável na pista.
Não dá para ultrapassar em 2017? Vettel, Sainz, Verstappen e as 58 manobras da 2ª etapa do ano dizem o contrário. Evidentemente não são tão fáceis quanto eram na temporada passada, mas ultrapassagens não são fáceis por natureza e o pacote aerodinâmico desse ano adicionou um elemento crucial nessa equação: coragem (James Hunt usaria outras duas palavras, mas elas não vem ao caso). Tal qual as próprias corridas de madrugada, ultrapassagens agora são merecidas, batalhadas e construídas. Brigas que duravam uma volta e meia até 2016 agora se estendem por mais de 15, e de quebra, a asa móvel não mais superpoderosa, agora apenas servindo para juntar o pelotão e aumentar a incidência de brigas no miolo, o que inclusive era seu propósito inicial. Graças a essa tempestade perfeita, tivemos duelos como Vettel e Ricciardo rasgando pelo 2º setor roda com roda e os espanhóis Sainz e Alonso usando cada milímetro da pista na briga pela 7ª posição. Por outro lado, a agressividade dos monopostos de 2017 pune os pilotos com menos braço, que sofrem ainda mais em condições adversas, mas essa não é uma consequência necessariamente ruim, afinal estamos falando do auge do automobilismo mundial. Apenas mais um processo seletivo, haja vista o número de rodadas e escapas durante a corrida.
A F1 não é mais competitiva? As três equipes diferentes no pódio e a diferença de 8 pontos entre 4 times no campeonato de construtores contam outra história. Mesmo que Bottas e Kimi tenham passado por uma corrida atípica em Shanghai, as Red Bulls estavam perfeitamente posicionadas para se aproveitar das circunstâncias, além disso, a partir do momento que o 3º colocado da prova largou em 16º, sorte pode ser descartada. Max fez uma corrida perfeita e provou mais uma vez que domina sob chuva, dando um show de ultrapassagens e performance.
Enquanto isso, Toro Rosso, Haas e Force India brigavam por pontos muito valiosos no meio do pelotão. Os italianos capitalizaram em uma atuação (quase) perfeita de Carlos Sainz, impulsionado pela estratégia ousada de ser o único piloto largando em slicks. O espanhol eventualmente achou um muro por causa dessa escolha mas a saída de pista não afetou seu grande resultado. Azar para Daniil Kvyat, que abandonou de forma discreta com problemas em seu bólido. Logo atrás de Sainz, Magnussen se redimia da barbeiragem de Melbourne, se tornando o primeiro piloto não chamado Romain Grosjean a pontuar pela Haas. Os americanos continuam em 7º, mas saíram do zero e encostaram na grande briga do pelotão intermediário. Já a Force India manteve a constância demonstrada na Austrália, sendo a única equipe entre as 4 a pontuar com os dois carros nas duas provas, se segurando na 5ª posição, apenas 2 pontos atrás da Toro Rosso. 4 times porque a Williams está no meio dessa confusão também, entretanto, FWs na chuva historicamente andam para trás. Stroll ficou pelo caminho ainda na primeira volta e Massa teve mais um final de semana para esquecer, a equipe de Grove saiu de Shanghai zerada e na 6ª posição entre os construtores, contando apenas com o 6º lugar do brasileiro na abertura da temporada. Já no fim do grid, Sauber e Mclaren seguem seus calvários. Enquanto os suíços simplesmente não conseguem progredir no grid, Vandoorne e Alonso pilotam verdadeiras bombas relógio, uma vez que mesmo com boas performance durante a corrida, esbarraram em problemas técnicos em suas duas aparições.
Se o primeiro circuito fixo do calendário nos proporcionou um espetáculo de corrida, só nos resta esperar o que Shakir proporcionará na 3ª etapa dessa temporada histórica.