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Entre vacilos e maracutaias, um campeonato muda totalmente – Dia 50 de 365 dias mais importantes na história do automobilismo

O ano de 1994 foi marcado por ser uma temporada bem trágica e cheia de polêmicas, como já foi contado aqui neste quadro. No ano em questão, Michael Schumacher assumia o trono como o grande nome da Fórmula 1, principalmente com a morte de Ayrton Senna. O alemão dominou a primeira parte do campeonato, vencendo seis das sete primeiras provas disputadas. Tendo um Benetton B194 Ford Cosworth como um conjunto bem equilibrado, o germânico dava o seu primeiro passo para consolidar a sua dinastia.

Um pequeno deslize e um grande prejuízo (Continental Circus)

No entanto, essa temporada é sempre tratada pelos críticos com asteriscos, em especial com as supostas irregularidades escondidas que o B194 tinha em suas engrenagens. As denúncias foram as mais variadas: de controle de tração a um sistema computadorizado de largada, além de mudanças ilegais na bomba de combustível (lembrando que aquela temporada foi marcada por profundas mudanças, como a obrigatoriedade do reabastecimento e o fim dos sistemas eletrônicos de tração e da suspensão ativa).

Acho que cabe ressaltar aqui, caro leitor, que a Benetton estava sim dentro do regulamento, ainda que por muito pouco, já que o regimento recém-alterado tinha suas brechas e uma escuderia que tinha pessoas bem sagazes nos bastidores, como Flavio Briatore e Ross Brawn, aproveitou-se muito bem do momento. Soma-se a isso o talento do jovem Schumacher, e a equipe da grife das cores unidas era a melhor do grid naquele início de campeonato.

Mas a esperteza tinha o seu limite…

O circo da Fórmula 1 ia para a oitava etapa do mundial, no circuito de Silverstone, para o Grande Prêmio da Grã-Bretanha, nos dias 8, 9 e 10 de julho. Enquanto o mundo se voltava para a Copa do Mundo dos Estados Unidos, os ingleses (que sequer foram ao mundial de futebol) lotaram o tradicional autódromo para torcer pela dupla da Williams, o compatriota Damon Hill e o escocês David Coulthard (que retornava após a passagem de Nigel Mansell no GP da França).

Hill começou fazendo a sua parte garantindo a pole, deixando Schumacher em segundo. Na sequência, veio a dupla ferrarista, com Jean Alesi e Gerhard Berger, a McLaren de Mika Hakkinen, a Jordan de Rubens Barrichello e a segunda Williams, de Coulthard.

Torcida britânica em festa (GP Expert)

No domingo da corrida, dia 10, Silverstone estava abarrotada, com as bandeiras britânicas tremulando e muita atenção por toda a Terra da Rainha. Inclusive a Família Real Britânica estava presente com a Princesa Diana e os seus filhos, Willian e Harry, ainda dois pirralhos na época.

Com os carros na pista, o começo foi bem tumultuado: a começar, Alessandro Zanardi teve que partir dos boxes, após sua Lotus ter problemas, indicando a fase claudicante da tradicional equipe. Na primeira tentativa de largada, a Williams de Coulthard apagou e uma nova largada precisou ser realizada.

Na segunda tentativa, a Jordan de Eddie Irvine enguiçou no meio da pista ainda na volta de apresentação, deixando o irlandês pelo caminho. Na partida, foi a vez do motor Peugeot da McLaren de Martin Brundle fazer um cosplay de churrasqueira por controle remoto e proporcionar um espetáculo pirotécnico na reta dos boxes. A corrida para o veterano inglês também chegava ao fim. No entanto, um incidente bem menor acabaria sendo o assunto do dia.

Tá pegando fogo, bicho! (Continental Circus)

Na primeira volta de apresentação, Schumacher deu uma estilingada e passou Hill, devolvendo a posição logo a seguir. O alemão também pulou à frente do inglês ao partir para a segunda volta de apresentação. A ação era ilegal, de acordo com o regulamento, embora já houvesse ocorrido em outras ocasiões e os comissários feito vista grossa. Entretanto, a direção de prova não foi tolerante com o piloto da Benetton dessa vez.

Após uma longa conversa, os comissários decidiram por aplicar um stop-and-go de cinco segundos para Schumacher na volta 13. O pessoal da Benetton protestou, alegando que havia um limite máximo de 15 voltas do tempo entre a infração e a aplicação de penalidade. Assim, Briatore mandou Schumi seguir na pista normalmente e o alemão não cumpriu a punição após três volta.

Para deixar a situação ainda mais dantesca, Schumacher foi para o pit na volta 17. Cumprir o stop-and-go? Que nada! A Benetton fez uma parada normal, com troca de pneus e reabastecimento. Aí os comissários ficaram pistola, inconformados com a cara de pau dos representantes da escuderia ítalo-inglesa. Na volta 22, o diretor de prova mostrava a bandeira preta para o número 5. Michael Schumacher estava desclassificado!

Para desespero da FIA, Schumi seguiu em frente mesmo com as punições (Bandeira Verde).

Mas se engana quem pensa que a Benetton baixou a cabeça. Schumacher cumpriu a primeira penalização (stop-and go) ao abrir a volta 27 e voltou à prova. O alemão seguiu até o fim, sem nenhum percalço no caminho. Só não conseguiu acompanhar o ritmo de Hill, que estava em um fim de semana iluminado.

O inglês levou o FW16 até a vitória no seu GP caseiro, levando a torcida ao delírio. Hill pegou uma bandeira da Union Jack e desfilou celebrando o seu triunfo, diante da massa em polvorosa. De quebra, ainda recebeu o troféu da vitória da Lady Di. No pódio, o piloto da Williams era o único que sabia a sua posição final.

Isso porque Schumacher cruzou a meta final em segundo na pista, mesmo com a desclassificação. Briatore passou o restante da corrida discutindo com os comissários tentando reverter a punição, enquanto o alemão concluía a prova e seguia todo o protocolo do pódio, como se nada tivesse acontecido. No fim, foi inútil. Schumi estava desclassificado e Alesi foi promovido para o segundo lugar.

E como se não bastasse, outra polêmica naquela prova. Pelo quarto lugar (o terceiro por direito), Hakkinen e Barrichello se digladiavam nas voltas finais. O piloto da Jordan tinha pneus mais novos, mas o competidor da McLaren se defendia como podia. Na última curva, o brasileiro viu uma brecha e tentou ultrapassar, mas o finlandês fechou a porta.

Briga de Barrichello e Hakkinen foi às últimas consequências (Continental Circus)

Hakkinen ficou na caixa de brita, enquanto Barrichello seguiu para os boxes com a suspensão avariada, sem tentar cruzar a meta final (Rubinho não sabia que aquela era a última volta). Os fiscais empurraram a McLaren para a pista e o finlandês conseguiu concluir a prova com a quarta posição na pista (terceiro real).

David Coulthard concluiu com o quinto lugar, após largar do fundo do grid após o problema da primeira largada. Em sexto ficou Ukyo Katayama, da Tyrrell. Este foi o último ponto da carreira do japonês na F1.

Após a prova, o pessoal da FIA não quis poupar ninguém após todo o salseiro em Silverstone. Depois do toque entre Hakkinen e Barrichello, os dois pilotos foram suspensos por uma corrida, sob o regime de sursis, quando a penalidade só é aplicada em caso de nova infração.

Já com Schumacher, a pena foi ainda mais implacável. Além da multa de 25 mil dólares para a Benetton, o alemão foi suspenso por duas corridas. A escuderia ítalo-inglesa tentou apelar no julgamento realizado em agosto, após o GP da Bélgica, mas a FIA foi inflexível.

Sem ter nada a ver com a confusão da Benetton, Hill fez a festa (Stats F1)

Assim, o piloto alemão acabou fora das etapas da Itália e de Portugal. Era a brecha que Hill e a Williams precisavam para voltar à disputa pelo título. Uma manobra infantil com um efeito borboleta devastador para o atribulado campeonato de 1994.

Review oficial da FIA para o GP da Grã-Bretanha de 1994

https:/youtu.be/UquNLRpLXIE

Fontes: Bandeira Verde, Continental Circus, Projeto Motor e Stats F1

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